Uma em cada três pessoas mortas nas estradas é vítima de atropelamento. É o que aponta levantamento da Arteris, concessionária que administra 21 rodovias, entre elas a Fernão Dias e a Régis Bittencourt, em São Paulo, com base em casos registrados neste ano. Segundo o estudo, a maior parte dos óbitos acontece à noite e envolve adultos.
A pesquisa analisou 19.164 acidentes registrados entre janeiro e julho, com 361 mortos. O estudo aponta que os atropelamentos são responsáveis por 32% das vítimas em estradas de São Paulo, Rio, Minas Gerais, Paraná e Santa Catarina. “Esse tipo de acidente representa 1% das ocorrências, mas quando se fala em gravidade é o que tem o maior porcentual”, diz Elvis Granzotti, gerente de Operações da Arteris. Ele também afirma que as principais vítimas em rodovias são pedestres (28%) e ciclistas (4%) que não estão montados na bicicleta no momento da colisão. Se o ciclista estiver pedalando, o acidente passa a ser classificado como “colisão traseira”. Esse é o segundo tipo mais letal de acidente, com 16% das mortes.
Na visão do especialista, os atropelamentos estão relacionados a uma série de fatores, como o comportamento de motoristas, que desrespeitam limites de velocidade ou trafegam pelo acostamento. “Quando há concentração em uma área, podem ser feitas intervenções: passarela ou calçada”, diz.
O metalúrgico Márcio Aparecido de Camargo, de 40 anos, entrou para a estatística de mortes por atropelamento na Fernão Dias. No domingo, 17 de junho, ele voltava para casa em Bragança Paulista de moto, quando o trânsito parou. Camargo não conseguiu frear e colidiu com o carro da frente. O amigo João Alcides de Souza conta que a batida foi leve, mas Camargo caiu e, quando se levantava, acabou atropelado por um caminhão. O corpo ficou preso à roda do veículo. “O motorista disse que não viu, só parou porque sentiu que algo estava travando a roda”, relata. “O mais difícil foi avisar a família, especialmente a mãe dele. Ele estava em um momento especial, tinha se casado havia poucos meses e estava feliz.”
Em julho, um homem morreu na Fernão Dias, em Atibaia, a 50 metros de uma passarela. “Há quem deixe de usar porque precisa percorrer distâncias curtas ou por questões de segurança, como assaltos”, diz Granzotti. A vítima não portava documentos e não foi identificada pela polícia. Segundo o estudo, 22% dos mortos por atropelamento são andarilhos.
A pesquisa também traça o perfil de veículos, horários e dias dos acidentes. Ao todo, 61% das mortes envolvem carros e 53,7%, motocicletas. Os casos normalmente acontecem entre 18 e 6 horas. “Além do sono, há diminuição de visibilidade”, afirma Granzotti.
Já na divisão etária, o grupo que concentra a maior parte das mortes é de 35 a 44 anos, com 24,67%. Apenas 5% dos óbitos são de menores de idade.
Fiscalizar
Consultor de trânsito, Flamínio Fichmann diz que o número de acidentes nas rodovias da Arteris impressiona. Para o especialista, o número de acidentes em rodovias pode cair até 50% se houver fiscalização intensiva. “O que diminui acidente é a fiscalização, com blitze em estradas. Mas isso significa aplicação de recursos e aumento de contingente.”
‘Foi um milagre não ter morrido’, diz ciclista vítima de acidente
Após colidir na traseira de um caminhão em uma rodovia paulista, o comerciante e ciclista profissional Rodrigo Padilla, de 51 anos, quase ficou tetraplégico. Teve a língua cortada e fraturou a coluna cervical em sete partes e o esterno – osso do tórax que ajuda a proteger coração e pulmões. “Foi um milagre não ter morrido porque foram muitas fraturas. Também foi um aviso. Agora, só pedalo em estrada com uma turma grande. Nunca mais pretendo voltar a fazer sozinho”, diz.
O acidente foi há cinco anos. Naquele dia, Padilla já havia pedalado 130 quilômetros e, cansado, baixou a cabeça para relaxar. Estava no acostamento, como manda a legislação de trânsito. “Não vi que um caminhão entrou de repente e bati na traseira. A culpa foi minha.”
O ciclista conta que, antes de sair de casa, sua mulher pediu pela primeira vez que não fosse treinar. “Eu pedalava sozinho havia quase oito anos”, diz. “No fim das contas, ela me salvou da morte. Nas lojas, capacetes de ciclista custam entre R$ 60 e R$ 1,5 mil. Minha mulher havia comprado o mais caro.”
Educador físico, Ricardo Arap, de 48 anos, coordena grupos que pedalam em rodovias. Mesmo com regras rigorosas, como carro de apoio e equipe de profissionais, o treino não é 100% seguro. “Não é garantia, mas minimiza riscos”, diz.
Para o diretor-geral da Associação dos Ciclistas Urbanos de São Paulo (Ciclocidade), Daniel Guth, falta infraestrutura nas estradas. “Não é capricho de um segmento. Estamos pedindo que o governo cumpra a legislação, que prevê a criação de um plano cicloviário”, diz.
O gerente de segurança e sinalização da Agência de Transporte do Estado (Artesp), Carlos Campos, admite que o governo do Estado não tem um programa para implementar ciclovias em todas as rodovias de São Paulo e o equipamento só é instalado a partir da demanda. “A quantidade de ciclistas é muito baixa e o custo para implementar todo sistema é muito alto.” Campos diz que a agência não recomenda andar de bicicleta no acostamento de estradas. “Não é seguro.”
Fonte: O Estado de S. Paulo